Sabia que são necessários 5kg de azeitonas para fazer um litro de azeite? E que o subproduto remanescente, chamado bagaço de azeitona, representa 80% da quantidade inicial de azeitonas, constituído pela polpa, caroço e pele? E ainda que esse bagaço de azeitona tem, na sua composição, compostos fitotóxicos, que apesar de terem um grande impacto a nível ambiental e económico, também podem ter efeitos positivos na saúde humana graças às suas propriedades antioxidantes? Então… como poderemos aproveitar o que sobra da produção de azeite, reduzindo o desperdício e a pegada ambiental, mas aproveitando os benefícios?

Antes de tudo, é necessária uma gestão cuidada do bagaço de azeitona, desde a sua remoção, passando pelo transporte ao armazenamento. Sendo a indústria do processamento de azeite uma das mais relevantes na economia portuguesa, as quantidades de bagaço de azeitona geradas são muito significativas, podendo ser prejudiciais a nível ambiental (se o bagaço for colocado no solo, por exemplo, os compostos bioativos do bagaço de azeitona inibem o crescimento de plantas). Depois, é fundamental encontrar uma estratégia de valorização desse subproduto tão rico em possibilidades.

Beatriz Oliveira, Maria Antónia Nunes e Rita Alves, investigadoras da Faculdade de Farmácia da U.Porto (FFUP) e do REQUIMTE, têm vindo a estudar as potencialidades do bagaço de azeitona e a trabalhar no desenvolvimento de novos subprodutos. São elas as mentes por trás de uma opção possível para aproveitamento do bagaço de azeitona: o SPRELIVE, um creme vegetal, para barrar, à base de azeite. Este produto alimentar inovador conjuga as propriedades benéficas do azeite com as de um extrato funcional e natural, extraído do bagaço de azeitona de forma sustentável. “O SPRELIVE atende a uma necessidade emergente dos consumidores: a utilização de ingredientes naturais na formulação de alimentos, associada a alimentos mais saudáveis”, referem as investigadoras. Além disso, procura-se ainda que o produto final tenha efeitos moduladores em fatores de risco para as doenças cardiovasculares.

Princípios da "química verde"

O modo de obtenção do extrato funcional, referem as investigadoras da FFUP/REQUIMTE, “não utiliza qualquer tipo de solventes químicos” seguindo, assim, os princípios da química verde para obter um extrato natural. “Esta estratégia baseia-se em princípios de bioeconomia e economia circular, sendo recomendada pelas políticas agroalimentares atuais a utilização de recursos e matérias-primas de forma sustentável. O nosso processo pretende encontrar o ponto de equilíbrio entre a recuperação dos compostos bioativos e a sustentabilidade ambiental e económica”, contam.

Além disso, o facto de ser um “azeite barrável” faz do SPRELIVE um produto funcional e conveniente, o que permite expandir as aplicações do azeite na alimentação diária. O caráter inovador do produto – que já tem dois pedidos de patente internacional submetidos (Europa e Estados Unidos) -  foi recentemente reconhecido no concurso Food Valorization & New Food, criado para apoiar projetos de inovação na área dos produtos alimentares tradicionais.

Levar o azeite barrável para as prateleiras do supermercado

O sonho das investigadoras passa, naturalmente, por colocar o SPRELIVE no mercado, de modo a “proporcionar melhores escolhas alimentares e contribuir para adoção de hábitos saudáveis dos consumidores”. Para isso, a próxima etapa será aumentar a escala do processo e, possivelmente, gerar novos players no setor oleícola.

Neste momento o SPRELIVE está numa ativa procura de parceiros comerciais para exploração e/ou comercialização da inovação. “As indústrias do processamento de azeite serão os principais “alvos”, uma vez que detêm as matérias-primas e os canais de distribuição tradicionais, podendo assim verticalizar a área de negócio, desenvolvendo e comercializando o SPRELIVE”, referem as investigadoras. No entanto, existe também a possibilidade de as empresas utilizarem apenas o processo de extração desenvolvido na FFUP/REQUIMTE e não o desenvolvimento do SPRELIVE o que, na opinião das cientistas, é “perfeitamente exequível uma vez que o extrato obtido pode ser disponibilizado para outras indústrias”.

Na opinião de Beatriz Oliveira, Maria Antónia Nunes e Rita Alves “é de extrema importância encontrar e promover formas inovadoras de maximizar as oportunidades que a indústria do azeite gera”, porque a produção de azeite tem aumentado consideravelmente e a tendência é para continuar. “O SPRELIVE pretende posicionar-se, assim, como uma alternativa a outros produtos da mesma categoria, no segmento dos produtos funcionais e ecológicos, sendo também uma aplicação inovadora do azeite, um produto tradicional.”, concluem.