Universidade da Beira Interior, Universidade do Porto, Audubon Sugar Institute (EUA), CeNTI, Universidade do Minho, e novamente Universidade do Porto. O percurso de António Ferreira, doutorado em Engenharia Química e Biológica pela Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP), é longo e diversificado, tendo sido desde sempre motivado pela curiosidade e “funcionamento das coisas”, conta em entrevista à U.Porto Inovação.

Quando era criança “um brinquedo nunca era só um brinquedo” e era capaz de passar horas a explorá-lo e até mesmo a desconstrui-lo para descobrir como tinha sido feito, que componentes tinha. Esses anos de menino viriam a transportá-lo para a carreira que continua, ainda hoje, a construir, tendo sempre a curiosidade como base do seu percurso: “Sendo a curiosidade uma espécie de pré-requisito para se ser investigador, acho que, sim, sempre quis ser investigador desde criança”.

Atualmente, António Ferreira dedica a maior parte do seu tempo a uma nova tecnologia que, diz, “pode vir a revolucionar o processo produtivo de alguns princípios ativos na indústria farmacêutica”. O foco principal desta tecnologia é a cristalização, que consiste num “processo de purificação utilizado em várias indústrias, nomeadamente a farmacêutica”, explica o investigador, que tem apostado na promoção da flexibilidade do processo de cristalização e na redução dos seus custos operacionais em contexto industrial. A tecnologia designada por Meso-OFR (desenvolvido no LEPABE/FEUP e CEB/ U. Minho) é um equipamento que opera em modo contínuo e permite o controlo constante da temperatura e da mistura dos reagentes, independentemente do caudal usado. Desta forma, consegue-se intensificar o processo de cristalização, diminuindo ou eliminando a formação de subprodutos e de etapas secundárias de purificação. Esta otimização do processo garantida, pelo Meso-OFR, contribui assim para a redução do desperdício. Este reator já está a ser testado na indústria farmacêutica, com a qual António Ferreira tem trabalhado bastante nos últimos anos. Os resultados são promissores, podendo chegar-se a uma redução de 99% no tempo de cristalização de um princípio ativo (API – Active Pharmaceutical ingredient). Além do processo de cristalização, o Meso-OFR pode ser utilizado na maioria dos processos industriais.

Enquanto investigador, António Ferreira acredita que a aproximação à indústria é fundamental. Daí que, desde os primeiros resultados obtidos através do Meso-OFR em laboratório, se tornou crucial para o investigador estabelecer contacto com os principais e potenciais interessados. Norteado por esse objetivo, tomou a iniciativa de enviar um email para algumas das maiores empresas farmacêuticas em Portugal, tentando a sua sorte: “Tínhamos excelentes resultados em laboratório, mas faltava-nos dar o salto e transferir a tecnologia para o tecido industrial. Nesse email descrevi as principais características da tecnologia, falei dos resultados alcançados e enviei. No dia seguinte já tinha pedidos de reunião por parte dos responsáveis de Investigação & Desenvolvimento dessas empresas”, conta. O maior sonho do investigador, e do grupo com quem trabalha, é conseguir implementar, efetivamente, a sua tecnologia numa “indústria caracterizada pela sua exigência técnica e científica”, confessa.

Apesar de reconhecer as excelentes condições de trabalho na Universidade do Porto para o desenvolvimento da sua investigação, António Ferreira considera que é urgente implementar uma verdadeira carreira científica dentro das instituições. “Os investigadores não podem andar uma vida inteira a saltar de concursos em concursos, numa intermitência que afeta o desenvolvimento dos seus projetos”, refere. E embora considere que este é um problema transversal a todo o país e que, acrescenta, “exige o compromisso de instituições, Governo e sociedade”, António Ferreira gostaria de ver a U.Porto destacar-se, num futuro próximo, “na valorização e proteção inequívocas dos seus investigadores”. Porque a curiosidade, sim, é um pré-requisito. Mas existem muitos outros, e a falta de garantia desses “penaliza não só os investigadores, mas o desenvolvimento do próprio país”, conclui.