Tempos houve em que os sonhos de Maria Helena Braga passaram pela arquitetura e os seus brinquedos preferidos, enquanto criança, eram cadernos, lápis, barro e madeiras, ou até mesmo um pequeno fogão elétrico onde cozinhava, como nos conta, “bolos, sopas e ovos mexidos”. Até que um dia, aos 15 anos, o livro “Um pouco mais de azul”, de Hubert Reeves, começou a fazê-la desenhar o percurso que vem traçando até aos dias de hoje.

Uma jovem decidida e perspicaz, a atual docente e investigadora da Faculdade de Engenharia da U.Porto (FEUP) não se satisfez apenas com a leitura do livro e entrou em contacto com o autor colocando-lhe questões sobre Entropia. A resposta não tardou, e com ela veio um convite para uma conferência que Hubert Reeves ia dar na Universidade de Aveiro, num dia que acabou por marcar toda a carreira académica de Helena Braga: “Pensei que todos os físicos eram assim interessantes e generosos no seu saber e, influenciada por isso e porque me apaixonei pelo conceito de “Entropia Vs. Informação”, fui para o curso de Física”, conta. A opção, no entanto, acabou por dar lugar ao que verdadeiramente cativa a investigadora hoje em dia que é a Ciência e Engenharia dos Materiais.

Uma das coisas que mais gosta ao fazer parte da família da Universidade do Porto é, como refere, a “liberdade para investigar”. Apesar de identificar problemas dentro da instituição, como é o caso da falta de incentivos ou a morosidade de alguns processos, a docente e investigadora acredita que é importante valorizar-se a ciência criativa e o prazer do trabalho em conjunto, sendo da opinião que “parte da criatividade se perde quando cada investigador faz um pedaço do trabalho, mas não há ninguém que veja a paisagem toda. Quero poder fazer sempre o que me divirta.”, diz.

O trabalho que se encontra a desenvolver atualmente, relacionado com baterias, partes de baterias e condensadores é um exemplo disso mesmo onde criatividade e trabalho colaborativo se juntam. A investigação tem sido desenvolvida numa parceria da U.Porto com a U.T.Austin, no Texas (EUA), uma ligação que, para Helena Braga, tem sido um verdadeiro prazer por todos os motivos mas principalmente por poder colaborar de perto com o professor John B. Goodenough: “É um homem que transforma o mundo. Tem 94 anos e uma vitalidade e uma capacidade de visualizar fenómenos físico-químicos absolutamente impressionante, além de ter inúmeros objetivos e projetos”, refere. Explicada de forma simples, a solução inovadora em que as equipas estão a trabalhar consiste num meio sólido que permite aos iões moverem-se nesse sólido com a mesma rapidez que fariam num líquido. Entre outras vantagens, este eletrólito de vidro “torna as baterias seguras (não explodem), amigas do ambiente (não contém poluentes) e baratas”, explica a investigadora. Apesar de a invenção ter já motivado o interesse de duas grandes empresas mundiais (para licenciamento e posterior desenvolvimento) a investigadora, como não podia deixar de ser, sonha sempre mais alto: “Gostaria que as baterias que fazemos fossem usadas por muitas pessoas. Gostaria que permitissem a substituição de automóveis movidos a gasolina por automóveis elétricos.”, refere.

Enquanto isso não acontece, Helena Braga continua a caminhar como está escrito numa das suas citações favoritas: “Caminhante não há caminho, se faz caminho ao andar” (António Machado, poeta espanhol do séc. XX). Quer poder fazer sempre o que lhe dê prazer e a divirta. Quer por as mãos na massa, ir para o terreno, aplicar o conhecimento ao longo dos anos de forma criativa. É também por isso que, falando outra vez do trabalho com o professor Goodenough, refere que está muitas vezes só a “saborear esta fabulosa oportunidade de aprender”. Esta e todas as outras que lhe surjam. Sempre: “Acho que ainda vamos poder inventar muito e trazer boa investigação para a U.Porto de uma maneira ou de outra, com colegas que muito prezo e num ambiente em que me sinto desprendida”, conclui.